Hoje
é dia de partir. A mala cheia de roupa suja está feita e eu acordo mais cedo
que o normal. Vou cortar a barba. Tarefa difícil visto que já tive o cabelo bem
mais pequeno do que tenho agora a barba. Longos minutos depois lá consigo
acabar a tarefa, nem pareço o mesmo, não sei se pela falta da barba se pelo
sorriso estampado na cara. O clima por estes lados não está o melhor. E
não falo do clima ambiental, falo das relações entre as pessoas. Notei nos
últimos dias uma agressividade não natural e não normal nos indianos. Estão
contra a nossa ida e têm feito tudo para que ela não se realize. Não temos
ainda um carro que nos leve ao aeroporto, e os indianos passam a manhã toda a inventar
pieguices do tamanho da minha barba hoje para nos atrasarem ao ponto de não
conseguirmos viajar. Um deles, inocentemente, diz-me que ficaria feliz se eu
perdesse o avião. Por momentos ganhei-lhe uma raiva enorme, mas preferi pensar
que a barreira linguística o impedia de me dizer que gostou foi do tempo que
por ca passei e o que lhe ensinei e que ria mais tempo… De entre as pieguices,
obrigaram-me, de roupa limpa e preparado para ir para o aeroporto a entrar no
recinto da fábrica e subir a um escadote manco para fechar um porta de um
armário com um LCD dentro. Insistiam que não a sabiam fechar, mas pelo amor de
todos os Deuses que eles têm, não sabiam rodar a porcaria de uma chaves?
Arranjem outra coisa por favor… Já com carro preparado para viajar para o
aeroporto e malas amontoadas entre a bagageira e o banco traseiro, entramos
pela última vez na casa de hóspedes para um último chá e para a despedida. Os
ânimos parecem mais calmos, mais sorrisos e mais descontração, talvez tenha
sido o chá… Nós só queremos vir embora, dizem-nos para não termos pressa, que
daqui ao aeroporto de Varanasi são só 30 minutos. Ainda assim decidimos partir
às 11h30, não queremos arriscar. Pegamos nas sandes de queijo e nas maças
gentilmente preparadas pelo cozinheiro e partimos rumo a casa. A cada portão
verde e pesado que passo sinto-me mais perto de casa e mais perto de ti. O
caminho até Varanasi é tortuoso, muitas populações, muito trânsito, muitas
pessoas, muitas vacas, alguns comboios com cerca de 50 composições, vê-se de
tudo por aqui. Um ligeiro despiste onde não estivemos envolvidos e que o
motorista acha piada, mas eu não tenho vontade nenhuma de me rir. Temos de
atravessar toda a cidade de Varanasi que é banha pelo Rio Ganges, o mítico rio
Indiano. Por momentos sinto-me realizado por poder ver o Rio Ganges, mas ao ver
a ponte que o atravessa, perco esse sentimento e sinto agora medo. Atravessámos
a ponte sem grandes percalços e chegamos a Varanasi, reparo que a meia hora que
nos falaram era errada, estamos ainda longe do aeroporto e já passa do meio
dia. Raio do indiano careca de voz estranha… Depois de ultrapassada toda a
cidade de Varanasi, depois de todo o seu trânsito caótico, das ultrapassagens
apertadas, das travagens bruscas das vistas sujas e degradadas, da pobreza
extrema e do que mais feio se pode ver no ser humano, lá chegamos ao aeroporto.
Depois do controlo feito pelo exército à entrada do aeroporto, as malas de
porão têm de passar pelo Raio X, e vá-se lá saber porquê, um funcionário do
aeroporto coloca-nos à frente de uma fila com cerca de 20 pessoas. Não percebi,
juro que não percebi… Chek-In feito, sandes de queijo no bucho, sorriso nos
lábios estamos prontos para embarcar! Após alguma espera chegou a nossa vez de
embarcar no avião “táxi” que vem de Kajuraho e tem como destino Delhi. Não
escondo a satisfação ao perceber que estou a levantar voo, parto em busca do
outro lado do Mundo, mas continuo demasiado longe, ainda assim sinto-me muito
feliz e parece que já nem sinto cansaço nenhum. Chegados
a Delhi o tempo de espera é enorme conseguimos um táxi para conhecer um pouco
mais da cidade e da cultura. O motorista decide então levar-nos a uma loja de
artigos tipicamente indianos, desde saris a elefantes de tamanho reduzido,
dentes de marfim completos e tudo mais que se possa imaginar por estas terras.
É tudo muito bonito mas o problema é que não podemos ver os artigos, pois temos
um indiano que nos persegue por toda a loja a perguntar o que queremos que ele
pode mostrar-nos e chega a dizer-nos que não nos podemos passear pela loja,
temos de comprar, as coisas na loja não estão em exposição, são para comprar e
não para ver. Ora se a minha vontade de comprar alguma coisa era pouca,
esfumou-se completamente nesse momento, e viemos embora. Pedimos para ir ao maior
centro comercial de Delhi. A viagem ainda é demorada e consigo por breves
instantes apreciar o que realmente é a India conhecida pelo ocidente. Toda esta
azafama, esta confusão e esta poluição. Um choque cultural enorme. Adorava
poder captar cada fragmento para levar comigo e poder mostrar, é-me impossível,
apenas o posso descrever com palavras. Chegamos então ao centro comercial onde
tudo está na mesma, e como tal, voltamos à mesma Pizza Hut, fomos atendidos
pelo mesmo empregado e sentamo-nos na mesma mesa. Só o pedido é que diferiu.
Que saudades de uma pizza assim! Venha outra e mais sobremesa. Que saudade de
comer algo doce, algo tão doce e tão enorme. Como era fácil de perceber,
comeram mais os olhos que a barriga, mas soube-me tão bem… Ora de voltar ao
aeroporto para apanhar o avião de regresso à Europa, de regresso à minha
Europa…
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