O
sol quando nasce é para todos, hoje é dia de voltar ao sol que na verdade já
sabe a inverno. Não ao nosso inverno, o inverno português, por aqui o sol
queima menos, mas continua a fazer suar, nasce muito cedo e esconde-se por
volta das 18 horas, reduz-me o tempo útil de trabalho, pois assim que ele se
deita a luz artificial deixa de ser suficiente para iluminar o trabalho e a
“mosquitagem”, que tem vindo a diminuir, invade-me o campo de visão. Faço
apenas mais um esforço para pensar que hoje será um dia novo, uma nova
realidade, um novo começo, cheio de força e de vontade, rumo à saída do túnel
onde me esperam os braços mais aconchegadores do Mundo. A realidade em Chunar
parece-me bem diferente, e apesar do pequeno-almoço em tudo igual aos outros,
sinto-me mais aconchegado e sinto um tratamento mais simples apesar da grande
dificuldade em se expressarem em inglês por aqui. À saída pedem-me para fazer
um registo por ocupar o quarto. O empregado tenta dizer o meu nome e a verdade
é que não fica muito longe da pronúncia, apenas a parte do Xavier soa estranha,
mas mais à frente conto o porquê. Aqui não temos motorista, por isso, o caminho
entre a casa onde dormimos e o escritório é feita a pé, na verdade são só 500
metros, não custa nada. A manhã parece arrastar-se, não há cá ninguém que
trabalhe e volto a sentir aquela dor junto ao estômago e aquela revolta por não
poder fazer o quero e o quero é mesmo começar a trabalhar para acabar o mais
rápido possível. As horas passam, os minutos arrastam-se a espera termina
algumas após o inicio, pouco tempo sobra até ao almoço, faz-se o que se pode.
Volta-se a caminhar para o almoço, desta vez comida sem picantes, e ainda um
fantástico pedaço de pão imaginem só. Um pão muito parecido com a configuração
de um molete de São José, com a mesma capa e mesma textura, mas sem o sabor
adocicado, sabia apenas a pão, nada mais, que bem me soube. Ao entrar no quarto
reparo no porquê da estranha pronuncia, tenho o meu nome escrito na porta e é
algo parecido com “Rvi Xravier” e quem o pronuncia em vez de ler “xis” no
início de Xavier lê “Exz”. A tarde rendeu mais, as pessoas aqui parecem mais
empenhadas, mais capazes, mais trabalhadoras. A falta de motorista levou-me a
experimentar algo que se revelou uma boa injecção de adrenalina. Apanhei boleia
de uma mota! Não andava de mota à cerca de 10 anos, e andar de mota a fintar
camiões, carros, bicicletas e pessoas é uma experiência fenomenal, sobretudo se
for feita na India e a 30 km/h. Hoje começo a reparar bem no meu quarto. Em vez
de uma cama gigante reparo que afinal tenho duas pequenas camas juntas, não me
importo porque só utilizo uma delas, tenho ainda uns chinelos que não são meus,
uma dúzia de capas de arquivo num armário, umas botas numa gaveta e uma mala de
viagem por cima do guarda-fatos, conclusão, este quarto pertence a alguém,
espero que não volte enquanto cá estiver eu.
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